“Laços de Família” é como se chama o
primeiro livro de contos da escritora brasileira Clarice Lispector. Publicado
no ano de 1960, é considerado o ápice de sua carreira, onde impera o modernismo
nos 13 contos ali presentes, sendo considerados por muito o mais belo livro de
contos já visto. Segundo Álvaro Lins, Clarice poderia ser lida no mundo
inteiro, em qualquer país, sem correr o risco de envergonhar seu país. É
considerado na obra um processo de “aprisionamento” dos indivíduos através dos
laços de família, como se fossem uma espécie de prisão cotidiana ou doméstica.
Considerada por alguns uma leitura perturbadora, é feita o que se pode chamar
de dissecação da classe social média do Rio de Janeiro, desnudando-a e a
expondo a uma visão descrente e desencantada da união familiar convencional,
que parece estar fadada à precariedade, transmitindo uma experiência pessoal
forte e intensa, na busca de respostas às questões mais íntimas e comoventes,
como se o simples fato de estar no mundo já causasse certa dor. Clarice opta
pela técnica de fluxo de consciência para desenvolver suas narrativas, deixando
o leitor a par do que acontece no íntimo dos protagonistas, pois os personagens
passam a impressão de estarem sempre atados, confinados ao ambiente familiar
por laços que, mesmo que não sejam saudáveis, não conseguem desfazer.
Os
contos que compõe a obra são:
§
Devaneio
e Embriaguez duma Rapariga;
§
Amor;
§
Uma
Galinha;
§
A
Imitação da Rosa;
§
Feliz
Aniversário;
§
A Menor
Mulher do Mundo;
§
O
Jantar;
§
Preciosidade;
§
Os
Laços de Família;
§
Começos
de uma Fortuna;
§
Mistérios
em São Cristóvão;
§
O Crime
do Professor de Matemática;
§
O
Búfalo.
Resumos
de alguns dos importantes contos da obra.
Amor
Relata a vida de uma pacata mulher chamada
Ana. Casada e mãe de dois filhos, possuía uma calma vida doméstica, onde
conseguia cuidar de seus entes e de seus afazeres com zelo e esmero. Era uma
mulher com grande instinto fraterno e maternal, muito sensível a tudo ao seu
redor. Certo dia, voltando para casa das compras domésticas, avistou um cego
que a impressionou grandemente. O bonde freou bruscamente, quebrando todos os
ovos que Ana havia comprado. A paz que a moça possuía após duras penas havia
desaparecido. Assim, ela desceu no Jardim Botânico ‘que por sua beleza a fez
temer o próprio inferno’. Pode-se fazer um paralelo entre a beleza que salta
aos olhos e o cego era privado de avistar, vivendo de fato um inferno em terra.
Finalmente chegou a casa, sentindo-se extremamente mudada. Abraçou o filho intensamente,
chegando a assustá-lo, e prontamente foi auxiliar o marido que havia derrubado
café. Pegou-lhe a mão carinhosamente e o levou ao quarto para que dormissem.
Uma
galinha
Tratava-se de uma galinha pronta para ser
abatida para o almoço de domingo. Porém, ao ser apanhada pelo pai da menina que
narra a estória, bota um ovo. Imediatamente a criança avisa os familiares que
agora a galinha é “mãe”. O pai da menina sente culpa por ter apressado a
galinha para o abate, e acaba transformando-a num animal de estimação, sob a
pena de que caso ela fosse sacrificada, nunca mais voltariam a alimentar-se de
frango. Contudo, certo dia “mataram-na, comeram-na e passaram-se anos”.
A
imitação da rosa
Narra a estória de Laura, que ao sair de uma
clínica psiquiátrica aguardava o marido Armando e alguns amigos para irem
jantar. Enquanto esperava, analisava a si própria como uma mulher imperfeita,
sem filhos, de coxas grossas, desinteressante e chata. Olhando para as rosas
que o empregado trouxera para a sala, vai se afundando em devaneios,
sentindo-se da maneira que se encontrava quando chegou à clínica, totalmente
perdida. Finalmente então, chega Armando. “Ela estava sentada com o seu
vestidinho de casa. Ele sabia que ela fizera o possível para não se tornar
luminosa e inalcançável. Com timidez e respeito, ele a olhava. Envelhecido,
cansado, curioso. Mas não tinha uma palavra sequer a dizer. Da porta aberta via
sua mulher que estava sentada no sofá sem apoiar as costas, de novo alerta e
tranquila como num trem. Que já partira.”
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